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sexta-feira, outubro 4, 2024
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Seguradoras ainda calculam perdas com incêndios

Após alta inicial de pedidos de sinistro, expectativa é de efeito contido no setor

A indústria de seguros tem acompanhado a severa estiagem que assola o país e os recentes incêndios, em especial os registrados no interior de São Paulo, em busca de estimativas do impacto, que ainda não puderam ser traçadas. A expectativa é que o efeito no setor não seja expressivo nem provoque aumento de taxas ou modificação nos produtos ofertados pelas seguradoras a produtores rurais.

As companhias, no entanto, já lidam com o crescimento dos pedidos de sinistro, principalmente nos segmentos agrícola e residencial. As próximas semanas ainda serão de altas temperaturas, o que reforça a incerteza sobre os efeitos da seca no setor.

Do lado da demanda, o evento tem provocado um aumento na procura por coberturas, especialmente por agricultores que começam o plantio nos próximos meses, mas também por proteção residencial.

“Ainda é cedo para falar de números, porque, no caso de São Paulo, o evento começou há pouco mais de 15 dias, e porque os segurados podem demorar para fazer a comunicação”, diz Magda Truvilhano, vice-presidente da comissão de riscos patrimoniais massificados da Federação Nacional de Seguros Gerais (FenSeg).

No segmento agrícola, “apesar de os valores de indenização ainda não serem alarmantes, a quantidade de sinistros é considerada alta pelas seguradoras para o período de tempo”, segundo informou a FenSeg no início do mês. Após um pico, o volume já voltou ao normal, disse Daniel Nascimento, vice-presidente da comissão de seguro rural da FenSeg, ao Valor.

A maioria dos sinistros acionados pelos segurados ocorreu na região central e noroeste de São Paulo, a partir de Ribeirão Preto. O fato de a principal cultura afetada, da cana-de-açúcar, historicamente não buscar cobertura de seguro pode tornar o impacto nas indenizações mais leve. O mesmo ocorre no caso do seguro pecuário e de pastagens afetadas.

“Não havia grande exposição das seguradoras, a base de contratação do mercado na região não é muito elevada”, disse Nascimento.

Segundo ele, as apólices em geral cobrem o risco de incêndio em lavouras. No caso da cana-de-açúcar, alguns contratos são feitos especificamente contra o fogo. A cobertura também é feita para máquinas e equipamentos e pode ser apoiada pelo governo por meio do Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR). “Os incêndios não são eventos que as seguradoras têm que precificar todo ano. Tem incêndio, mas é pontual, e as companhias colocam no rol de produtor. Existe uma precificação, mas a incidência é muito pequena”, contou Nascimento. “Mesmo nesse ano, que tivemos essa região muito afetada, não vai dar grandes saltos na sinistralidade”.

A percepção geral é que a situação poderia ser mais grave se os incêndios tivessem acontecido durante a colheita das culturas de inverno. “Para bem ou mal, demos sorte porque a safra de inverno já foi colhida, mas, mesmo assim, ocorreram prejuízos que estão sendo contabilizados. A seca é generalizada e os incêndios ainda estão acontecendo, o que torna difícil mensurar o tamanho dos danos”, diz James Hodge, diretor de agronegócio e construção da corretora WTW. No agro, em geral, é raríssimo ter casos de perda total, explica Hodge. “É muito difícil destruir a plantação inteira”, diz. Há uma expectativa, porém, de muitos danos em estruturas e equipamentos, como colheitadeiras e máquinas de roçagem.

O mercado também acompanha se haverá algum impacto na produção de trigo. “Ainda há um risco porque a colheita de trigo está começando agora. Algumas ainda estão em risco de incêndio e precisamos monitorar”, diz Daniel Pauli, responsável pela área de sinistros da Sombrero Seguros.

O produtor de trigo Edjelton Martins, de Ipaussu, município próximo a Santa Cruz do Rio Pardo (SP), resolveu dessecar sua lavoura para antecipar em dez dias a colheita do cereal e evitar qualquer chance de danos provocados por incêndio. Na região, não chove há mais de cem dias e relatos de queimadas em propriedades vizinhas assustaram o produtor.

Martins, que possui uma área plantada de cerca de 80 hectares segurada, preferiu perder em qualidade de maturação, colhendo antes, e até ter depreciação no valor do produto, do que ter de pagar uma franquia por prejuízo total. “Quando pega fogo, fica complicado. Ano passado eu tive queimada nas áreas por causa da seca. Então, desta vez eu dessequei o trigo e adiantei a colheita para não comprometer a produção”, lamentou.

Até agora, a Sombrero não teve impacto direto das queimadas, mas tem acompanhado um aumento neste ano das notificações de prejuízo por causa da seca. “Ela já trouxe um pouco de prejuízo nas lavouras de grãos. Estamos com bastante sinistro no Paraná, no Mato Grosso do Sul e em São Paulo devido à seca. O milho, por exemplo, teve uma queda de produtividade por causa do período sem chuva”, afirma Pauli.

Neste ano, não houve indenização por incêndio nas apólices cobertas pelo programa de subvenção PSR. Dos R$ 741,5 milhões pagos até setembro, 99,7% são referentes à seca. Na sequência aparecem chuva excessiva (0,12%), ventos fortes (0,11%) e granizo (0,05%). No acumulado desde 2016, foram pagos R$ 856 milhões em indenizações de seguro rural por incêndio, o equivalente a 0,36% do valor total desembolsado no período, de R$ 235,4 bilhões. O principal evento causador de sinistros é a seca, que responde por 77,84% do valor pago no período.

“Ainda é cedo para falar de números, porque, no caso de São Paulo, o evento começou há pouco mais de 15 dias” — Magda Truvilhano

O nível de penetração dos seguros agrícolas no país ainda pode ser considerado baixo, de cerca de 10%. A dos seguros residenciais é de 17%, segundo dados mais recentes da FenSeg, de 2021. Em São Paulo, o percentual é maior, de 29%, sendo mais concentrado nas áreas urbanas.

A cobertura básica de seguros residenciais inclui obrigatoriamente incêndios tanto quando eles começam dentro de casa – como é mais comum – como fora dela. Nos rurais, a cobertura pode ser da produtividade e incluir a perda de bens patrimoniais. De forma geral, as seguradoras garantem a cobertura de incêndio, com a exceção de quando há dolo do segurado, ou seja, quando ele mesmo ou pessoas ligadas provocam o evento.

Do lado da demanda, as seguradoras têm notado um aumento do interesse por seguros agrícolas tanto em produtos com cobertura de risco nominal, exclusivo para incêndios, quanto nos de multi-risco, que incluem uma espécie de “franquia” para perdas causadas por extremos climáticos.

Um grupo que foi diretamente afetado pelas queimadas do último mês e no qual houve uma certa mudança na percepção de risco é o de pequenas propriedades rurais, diz Fabio Damasceno, diretor técnico de seguro rural da seguradora Mapfre. “São fazendas de pecuária de corte e de produção de leite. Elas não costumam ter muita adesão aos contratos de seguro, mas notamos em nossos canais de consulta um aumento na demanda pelos produtos, sobretudo para a proteção das benfeitorias, dos equipamentos e do rebanho”, afirma.

Na corretora Vokan, que atua principalmente nas regiões Sudeste e Centro-Oeste, a demanda por um produto voltado exclusivamente para produtores de cana aumentou 200% em agosto, com o avanço das queimadas, diz o responsável pela área de seguros agrícolas, Weverton Anício.

“Até agora, acreditou-se que o maior risco do produtor de cana é o incêndio e que, mesmo com o incêndio, é possível fazer a colheita e ter alguma produtividade aferida. Porém, um evento com a proporção do atual pode mudar essa visão”, afirma, ressaltando a baixa penetração dos seguros na cultura da cana.

Os produtores de grãos, que vão iniciar a produção nos próximos meses, também têm buscado mais as corretoras, conforme o relato de três empresas do ramo ouvidas pelo Valor. “Além da incerteza do valor das commodities, que é comum, os produtores começam a enxergar os riscos de ter a produção impactada pelas mudanças climáticas”, diz Anício.

Na Agrotech, corretora especializada em seguros agrícolas, a demanda tem aumentado não só para a cana, mas para outros cultivos como trigo e milho. A preocupação com a ausência de chuvas e os recentes indícios da região de Ribeirão Preto acenderam um alerta em grande parte dos produtores de trigo da região, diz Danilo Criveli, sócio da corretora.

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De janeiro ao início de setembro, a Agrotech pagou em indenizações aproximadamente R$ 28 milhões a produtores de cana-de-açúcar segurados em razão dos períodos de seca e dos incêndios. Atualmente, a empresa atende 1 mil clientes do agro.

“Vemos áreas afetadas de milho, em algumas roças e na beira de estradas de Ipaussu. Os incêndios acabam assustando os produtores e os sinistros aumentam. Existe procura e preocupação maior desde o final de agosto”, acrescenta Criveli.

O seguro agrícola arrecadou, no primeiro semestre de 2024, R$ 2,2 bilhões, 16,3% menos que um ano antes. As indenizações cresceram 2,3%, para R$ 1,8 bilhão. Nos seguros residenciais, as indenizações pagas cresceram 31% no mesmo período, para R$ 889,3 milhões e as contratações avançaram 25,3%, para R$ 2,9 bilhões.

Fonte: Valor Econômico

 

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