Cerca de 24% das emissões de gases estufa no Brasil vêm da agropecuária; pesquisador indica que mercado regulado normalmente prioriza outros setores.
O projeto de lei (PL) que cria o mercado de carbono no Brasil, aprovado na Comissão de Meio Ambiente (CMA) do Senado nesta quarta-feira (4), excluiu a agropecuária das regras de regulamentação.
O setor é o que mais emite gases de efeito estufa no país, segundo sistema promovido pelo Observatório do Clima.
A demanda pela exclusão do agro partiu da Frente do setor no Congresso, que conta com mais de 300 parlamentares, e foi acatada pela relatora, Leila Barros (PDT-DF).
O principal argumento para a retirada do setor é de que não há métricas acuradas o suficiente para a inclusão no mercado de carbono.
Segundo dados de 2021, cerca de 24% das emissões de gases estufa no Brasil vêm da agropecuária. Só há mais emissões com uso da terra e florestas (49%) — mas se projeta que este dado também seja impactado pelas atividades do setor.
Energia é responsável por 17%, e processos industriais, por 4%.
Coordenador do programa de Política e Economia Ambiental do Centro de Estudos em Sustentabilidade da FGV, Guarany Osório indica, todavia, que há mérito na escolha. Segundo o especialista, os mercados regulados de carbono mundo afora normalmente optam por não incluir o setor.
“De fato, ao redor do mundo, este tipo de instrumento de mercado de carbono regulado é mais aplicável aos setores industrial e energético. Estes setores têm métricas de mensuração de carbono mais consensualizadas e acuradas. Cada tonelada de carbono deve ser medida rigorosamente, já que vai se tornar um ativo financeiro”, explica.
Osório destaca, porém, que a versão inicial do texto de Leila Barros era mais adequada. A redação estabelecia que emissões acima 25 mil toneladas de gases do efeito estufa tornavam os agentes elegíveis para o mercado de carbono, mas não trazia recorte setorial — ou seja, não incluía ou excluía atividades.
Para o especialista, o modelo anterior deixava a “porta aberta” para a regulamentação, gradativamente, estabelecer os setores que vão fazer parte do mercado. Com isso, haveria tempo hábil para discussões aprofundadas sobre mensuração de emissões e especificidades setoriais, que poderiam permitir a inclusão do agro em um momento futuro.
Fora do mercado de carbono, agro está dentro da política climática
O pesquisador explica que o mercado de carbono não é uma “bala de prata”, no sentido de encaminhar o Brasil às suas metas. A regulamentação faz parte de um pacote de políticas públicas para este fim.
“Cada instrumento vai ser aplicado para um setor. Para redução do desmatamento ilegal, vai precisar de comando e controle da Polícia Federal, polícias estaduais, do Ibama. Para outros setores, você pode ter outros instrumentos, financiamento, mercado de carbono, projetos de eficiência”, explica.
“O Brasil está montando o pacote para chegar à sua meta climática”.
De acordo com Osório, mesmo fora do mercado de carbono, o agro está dentro do compromisso climático brasileiro. Por isso, outros instrumentos vão ter de ser utilizados para controlar as emissões do setor.
“Apesar de não ser perfeito, o projeto é bom”, defende o especialista.
Aprovado por unanimidade na CMA, o PL cria o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões para empresas que emitam mais de 10.000 toneladas de dióxido de carbono por ano. Companhias que reduzirem suas emissões poderão vender os créditos que acumularem para aquelas que não cumprirem as cotas e acabarem poluindo mais.
Os créditos de carbono poderão ser negociados no mercado financeiro e serão incluídos no Imposto de Renda, transformando em dinheiro a redução dos gases de efeito estufa.